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Covid-19: Empregos são dizimados nos EUA, enquanto governos europeus financiam postos de trabalho

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Mais de quatro milhões de americanos se inscreveram para receber seguro-desemprego nos Estados Unidos na última semana de abril, elevando para mais de 30 milhões o total de pessoas que se candidataram para receber o auxílio nas seis semanas desde que o país se trancou para frear o novo coronavírus. Estima-se que o índice de desemprego americano pode ter sido de 20% em abril, o mais alto desde a crise de 1929, quando alcançou 25%. O recorde, segundo estimativas, pode vir a ser superado ainda neste trimestre.

Embora a interrupção de grande parte das atividades econômicas em função da pandemia de Covid-19 fosse inevitável, o nível atordoante de desocupação nos Estados Unidos resulta de decisões políticas e econômicas. Devido, em parte, a um programa do governo de Donald Trump considerado malsucedido, e, em parte, a uma cultura laboral que confere grande flexibilidade às empresas, com forte aposta no laissez faire do mercado, dezenas de milhões de pessoas se viram demitidas de cargos que, em grande parte, não voltarão a existir.

Em contraste, os governos da maioria dos outros países desenvolvidos ocidentais — as potências da Europa e o Canadá — adotaram leis para que suas empresas mantivessem seus trabalhadores, subsidiando grande parte dos salários destes, de modo a evitar demissões em larga escala. Em consequência, viram seus índices de desemprego permanecerem muito mais estáveis: na Alemanha, a estimativa do pico do desemprego para 2020 é de cerca de 5,9% em meados do ano, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Ifo, de Munique, com uma variação total para o ano entre 0,2% e 0,5%.

As consequências das alternativas entre o aumento vertiginoso do desemprego nos EUA ou o amparo estatal à conservação dos cargos em países da Europa se prolongarão além de um futuro próximo, e interagem com outros setores do sistema de proteção social e da economia de cada lugar.

Em seu objetivo, o programa pretendia que empresas pequenas e em dificuldades obtivessem empréstimos durante a pandemia. As regras para aprovação no programa, entretanto, eram bastante frouxas e confusas, e permitiram que muitas empresas e indivíduos milionários, com departamentos jurídicos muito mais estruturados, fizessem suas inscrições com mais velocidade, tendo vantagem sobre pequenos negócios.

Embora 70% das pequenas empresas americanas tenham se candidatado ao programa, uma pesquisa da Goldman Sachs constatou que apenas 29% destas candidatas receberam dinheiro. Segundo uma investigação da agência Associated Press, ao menos 94 das empresas que foram contempladas tinham ações na bolsa de valores, e algumas tinham valor de mercado de mais de US$ 100 milhões.

— Os subsídios foram para as próprias empresas e não para os indivíduos, com a promessa de que não demitiriam. Mas é difícil acreditar nessas companhias, porque, na última vez que receberam subsídios, elas compraram ações — afirmou Arne Kalleberg, sociólogo da Universidade da Carolina do Norte em Chapell Hill especializado no mercado de trabalho americano. — Muitas pequenas empresas também não quiseram receber o dinheiro, porque acharam que não conseguiriam manter os seus trabalhadores.

Na quinta-feira da semana passada (23),  o Congresso aprovou uma nova fase para o programa, de US$ 310 bilhões. Houve a reserva de cerca de um quinto do total para para pequenas e médias empresas, mas o programa recebeu críticas de que as suas regras eram as mesmas, e que o apoio deveria ir diretamente para os trabalhadores.

Neste cenário, o seguro-desemprego foi a fonte de renda que sobrou para os americanos que pararam de trabalhar durante a pandemia. A abrangência do auxílio foi expandida a um padrão considerado generoso para os EUA, com a sua duração tendo sido prolongada e várias outras categorias passando a serem contempladas por ele, como autônomos, artistas, trabalhadores que recebem salários baixos, entre outros.

O modelo europeu

Um programa alemão criado após a crise de 2008, chamado Kurzarbeit — em tradução literal, trabalho de curta duração — ofereceu o caminho para os países da União Europeia durante a crise. A iniciativa, considerada bem-sucedida na época e um dos motivos para a rápida recuperação da economia alemã, incentivava escalas reduzidas para desestimular as demissões, com o governo financiando parte dos salários.

Apesar de diferenças entre os países, os subsídios têm sido a regra para a maioria dos governos nacionais europeus, com pagamentos que variam de 60% a 90% dos salários dos trabalhadores. A Alemanha promoveu ajustes no programa, para que mais empresas se classificassem, e milhares de companhias se inscreveram. Famílias com dependentes recebem 67% de seus salários pagos pelo governo, e outros trabalhadores, mais de 60%.

O ministro das Finanças da França,  Bruno Le Maire, copiou explicitamente o modelo alemão, e quase nove milhões de trabalhadores de mais de 700 mil empresas do país — um terço da força de trabalho na iniciativa privada francesa — entraram no programa, que cobre até 84% dos salários.

O pacote britânico, que inclui também autônomos, cobre até 80% do salário dos trabalhadores, com o limite máximo de £ 2.500 (R$ 17 mil), e se estende, inicialmente, até junho. O dinamarquês varia entre 75% e 90% dos salários, e o holandês chega a 90%.

Após perder, em três semanas, o mesmo número de empregos que desapareceram ao longo de dois anos na crise de 2008 e 2009, a Espanha proibiu demissões e criou um mecanismo de auxílio, mesma direção que tomou a Itália. Os países, junto a Portugal, têm menor capacidade fiscal que os europeus do norte, e encontram-se em uma disputa com estes para que a União Europeia seja mais firme em seu socorro.

Culturas e futuros

As políticas trabalhistas do bloco europeu e dos EUA em tempos de Covid-19 são compatíveis com as suas respectivas economias em épocas sem crises. Há muito, vigora um orgulho nos Estados Unidos de um sistema de trabalho “flexível” e “independente”, baseado na noção de que a regulação estatal atravanca os negócios e de que a rotação entre empregos é saudável. Do mesmo modo, a rede de proteção social europeia é notoriamente mais robusta, com cargas tributárias mais altas.

— Sempre foi muito fácil demitir nos Estados Unidos — afirmou Kalleberg, o sociólogo de Chappell Hil. — Muito mais coisa poderia ser feita para melhorar a proteção social aqui, mas para isso seria preciso aumentar impostos, o que neste país é inadmissível.

Tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, os programas tendem a funcionar melhor se o período de fechamento da economia for curto, o que permitirá que as empresas retomem seus negócios em uma posição mais parecida à anterior, com uma penúria também mais diminuta por parte dos trabalhadores.

Quanto mais tempo as economias permanecerem em suspensão, maiores são as chances de que ocorram grandes mudanças, e de que os custos para os Estados se tornem mais altos. Setores inteiros, como restaurantes, cinemas ou o turismo podem se ver desestruturados.

Neste sentido, os dois programas carecem, segundo Dennis Snower, presidente do think tank Global Solutions Initiative, de Berlim, de uma preparação em médio prazo para o trabalho resistir ao mundo pandêmico.

— A preservação dos empregos foi bem-vinda no curto prazo, para evitar o derretimento econômico. No médio prazo, é necessário se adaptar para um novo mundo, no qual precisaremos de mais resiliência.  Temos que ajustar as atividades econômicas, adequando empregos em muitos setores para que se tornem compatíveis com as novas circunstâncias — afirmou Snower. — No momento da adoção dos planos, a questão da duração não foi colocada. Conforme o tempo passar, a importância dela irá aumentar. //  O Globo.


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