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Cidade de Newark capturada nos livros de Roth é muito diferente da atualidade

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“Ele deixou esta cidade, mas ela nunca saiu de dentro dele. É um lugar cheio de falhas, mas que ele amava do jeito que amamos aqueles parentes com quem brigamos.”

Num dia quente desta primavera americana, o advogado Manny Antunes andava pelas ruas de Newark tentando explicar o charme rude do lugar onde Philip Roth nasceu e construiu os pilares de seus romances monumentais. O autor de “O Complexo de Portnoy” e “Pastoral Americana”, morto dias atrás, descreveu em seus livros uma cidade onde judeus como ele se dividiam entre os trabalhadores e donos de pequenos negócios que se amontoavam nos arredores do parque Weequahic, no bairro mais ao sul, e empresários e médicos com casas grandes bem no centro.

Seu subúrbio quase plácido dormia à sombra dos arranha-céus de Manhattan brilhando como uma miragem do outro lado da “grande barreira que era o rio Hudson”. Newark, nas memórias pedregosas e desencantadas de Philip Roth, era um lugar de gente de bem à beira do abismo, onde atritos irrefreáveis abortavam o sonho americano no embrião. Não poderia ser mais nítido o contraste. O mesmo trem da infância do escritor, que sai do coração de New York e desemboca na biblioteca onde ele se refugiava para imaginar seus enredos, desliza entre vagões e locomotivas em decomposição e galpões oxidados, resquícios de uma era industrial há muito esquecida. Mas fãs mais ardorosos do autor, como Antunes, veem mais que um ferro-velho. “Ele alçou nossa cidade ao nível do que James Joyce fez com Dublin ou Franz Kafka fez com Praga”, ele diz. “Newark é outro de seus personagens.”

E tal qual uma coisa imaginada, a maior cidade de New Jersey permaneceu congelada nos livros de Roth, muito distante daquilo em que se transformou. Nas últimas décadas, talvez tentando preservar em âmbar aquela Newark de sua juventude, o escritor tomou distância e foi viver entre Manhattan e um povoado rural. O estopim dessas mudanças foram as revoltas de 1967. No auge do movimento pelos direitos civis, um caso de violência policial contra um taxista negro provocou um levante popular que deixou um saldo de dezenas de mortos, destruiu o bairro judeu e provocou o êxodo da classe média branca. Newark, desde esse episódio traumático também retratado pelo escritor em “Pastoral Americana”, virou uma cidade de maioria negra e de imigrantes que muitas vezes nem sabem quem foi Roth. Um raro vestígio daquela Newark de Roth, no entanto, sobrevive no Hobby’s, o último restaurante judaico do centro, a poucas quadras dali. No horário do almoço, policiais devoram sanduíches de pastrami e uns homens mais velhos resmungam sobre um prédio de 17 andares que estão construindo à beira do rio, tapando a vista de Manhattan.

Mesmo na escola onde Roth estudou quando adolescente, pano de fundo de uma série de passagens em “O Complexo de Portnoy” e “Complô Contra a América”, o escritor também virou lembrança desbotada. Os romances que ele escreveu, no entanto, não são assunto das aulas de literatura do colégio. Roth, pouco antes de morrer, até mandou doar algumas cópias deles para que formassem um clube do livro. Vizinho da casa onde o autor viveu na infância, que nos últimos dias se tornou destino de peregrinação de fãs e jornalistas, Mostafa Mohamed não entendia toda a comoção. “Só sei que ele era um autor famoso com muitos seguidores”, disse o imigrante egípcio. “Todo mundo vem tirar fotos.”


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